terça-feira, 23 de junho de 2020

Os números, a cretinice e o politicamente correto

Mano...tem sido uma bad trip tentar escrever para o Blog.  Não só esse mas para o outro que eu tenho também. Não é de hoje que a vontade e o impulso pra escrever não aparecem. Vem de mais tempo. Um tempo que eu estudava e queria viver desse sonho. Esse sonho passou...não há mais estímulos em mim para seguir na vida acadêmica. Transferir a culpa nisso é muito fácil...mas o verdadeiro culpado sou eu. Então, peço paciência pra caso a estrutura textual não seja das melhores. 

Uma coisa que fiz na quarentena foi recontar todas as latas da minha coleção. Ao todo...com uma margem de erro de 10 latas para mais ou para menos...foram contadas 2744. Pode ser um número grande pra ti mas para mim não é. São 2744 histórias em 18 anos. Dezoito anos são 6570 dias. Se você pegar uma calculadora aí vai ver que em 40% desses dias eu me dediquei a busca de latas. Não é pouca coisa mas vou parar de falar em números pq se continuo a fazer estatísticas sobre histórias...elas vão perder o seu significado. Tipo os números de mortes da Covid 19 no Brasil. São 51 mil pessoas perdidas e infelizmente para muita gente é só mais um número do que milhares de famílias em luto. Afinal, uma morte é uma tragédia...várias delas viram estatísticas. 

Além disso, venho falar dessa lata:


Demorou e está demorando para enfrentarmos temas que fazem qualquer almoço de família virar a explosão de Chernobyl: Racismo, Machismo, Homofobia, Gordofobia, Desigualdade social e tudo que foge da cretinice da perspectiva das pessoas brancas, privilegiadas e intocáveis. No meu caso em particular, a consciência crítica e política sobre algumas latas da coleção põe em cheque essas bandeiras das causas sociais que tanto levanto e simpatizo. 

Assim, quando vem uma lata igual a essa da foto (uma cerveja russa e na lata uma mulher com decote provavelmente servindo cervejas à homens) o políticamente correto pesa. Fico pensando se o fato de aceitar tais latas ou até mesmo comprar e estar financiando empresas com esse tipo de política cretina, preconceituosa e estereotipada...não fere as bandeiras que tanto apoio. Lembro que o maior exemplo que tenho na coleção é uma lata de cerveja da África do Sul que remete a cerveja mais consumida no período do Apartheid pelos brancos. 

Essa situação me leva a pensar sobre não aceitar tais tipos e propagandas em latas. Para um colecionador...Esse pensamento nem seria cogitado como um filtro no que deve ou não deve estar na coleção. Pra mim...Esse pensamento é recorrente por pelo menos uns 4, 5 anos.

Hoje, não tomei atitude se jogo fora ou não. A medida paliativa foi escondê-las atrás de um turbilhão de latas que me remete a diversidade e aquilo que me remete e que me dá uma esperança por um mundo mais suave.

Não sei o que fazer. Se tiver uma sugestão...me mande por favor. 

Obrigado pela leitura. 


terça-feira, 31 de março de 2020

Os "quase" últimos 18 anos de coleção

Segue uma narrativa da bad:

Deitado numa maca no pronto-socorro do hospital e já medicado e esperando os resultados dos exames para saber o que era o motivo de tanta dor nas costas e no peito esquerdo, começo a ver uns 4 ou 5 enfermeiros e enfermeiras me rodeando. Enquanto isso, chega a médica plantonista e fala:

- Tiago, precisamos conversar! 

Eu vi ela puxando uma cadeira pra ficar do meu lado e senti picadas de injeções de anticoagulantes na barriga e pensei:

- Isso só pode ser coisa séria.

A médica continua e sem rodear já foi direto ao assunto:

- Você tem pneumonia e suspeitamos que tenha algo pior no pulmão. Por isso, você ficará internado talvez na UTI.

Foi o primeiro gol de uma goleada sofrida naquela semana. Trabalhando muito, a primeira coisa que pensei era ter que pedir afastamento do trabalho e perder dinheiro (estupidez...eu sei...mas foi o que senti). Chamei meus pais e comuniquei que dali não sairia e ficaria no hospital. Não mencionei a UTI pq achei que era muita bad trip pra falar por WhatsApp. Depois de horas esperando a liberação do convênio para a internação, finalmente realizo o exame necessário: Uma tomografia com contraste. O diagnóstico: tromboembolismo pulmonar. Esse foi o segundo e o terceiro gol da goleada juntos.

Se você não sabe o que é essa doença é o seguinte: um coágulo se formou na minha corrente sanguínea (não se sabe ainda de como surgiu) e virou uma roleta russa dentro do meu corpo. Ou seja, ele podia parar em qualquer lugar e decidiu parar no meu pulmão esquerdo. Bloqueou a minha passagem de ar e me causou uma dor nas costas e no peito esquerdo além de uma falta de ar como se eu tivesse afogando. As consequências foram dois dias internado no hospital (no quarto e não na UTI pq meu corpo reagiu muito bem aos medicamentos e não precisei ficar sendo monitorado o tempo todo), não ter mais o controle do meu corpo e por isso depender de um remédio que talvez usarei por um bom tempo para me manter vivo, ser agora grupo de risco de qualquer doenças que envolvem o trato respiratório (inclusive a Covid-19) e sustentar uma bad trip mental sem tamanha até hoje. Esses foram o quarto gol sofrido.

Quando estava internado, não tinha a noção do que aconteceu e nem da gravidade da questão mesmo vendo a preocupação da minha família, amigos e namorada. A médica responsável do hospital veio até o quarto e veio falar comigo. Percebeu que eu estava com um semblante normal e perguntou:

- Acho que vc não tem ideia da gravidade do que aconteceu contigo.

Respondi que não e ela:

- Quando vc receber alta, sua ficha vai cair.

Era uma terça feira de manhã, eu assistindo American Chopper, ela entra no quarto segurando os papéis da alta e os laudos de todos os exames que fiz e diz:

- Tiago, vamos pra casa?

Me levantei igual uma lontra cheirada, me troquei, assinei todas as papeladas da alta, agradeci todos e todas que cuidaram de mim e esperei meu pai vir me buscar. Na minha cabeça, a bad bateria um tempo depois, porém ela veio igual um buffalo quando entrei no carro e estava indo pra casa. Foi no caminho pra casa que senti o quinto e o sexto gol da goleada.

Aquele dia foi todo choroso pra mim. Queria ficar em silêncio, não suportava a ideia de não ter o controle do corpo e ser mais vulnerável com apenas 29 anos. Foi a segunda vez que enfrento uma situação de vida ou morte. Na primeira vez eu tirei de letra. Dessa vez eu sofri mais. Muito mais. Fiquei incrédulo e se pá estou até hoje. 

Porém, a primeira coisa que fiz quando cheguei em casa foi ir ao quarto das latas. Fiz sem pensar. Não tive a consciência de que estava indo lá e só prestei atenção quando me peguei de frente com elas. Quando tô na bad, uma coisa que eu faço é ficar do lado de uma das estantes e reparar, com os meus meros 1,80m de altura, o quão altas são as estantes que suportam todas as latas e me sinto abraçado e acolhido. 



Essa lata que escolhi (presente do meu amigo Eduardo) ilustra esse texto não só pq o assunto foi vida e morte, mas sim, pelo momento que vivemos hoje de pandemia (me desculpa se isso é macabro).

A última coisa que queria relatar é que no primeiro dia em casa depois das alta, eu estava assistindo Moneyball com o Brad Pitt e tem uma cena que ele fala que o importante não era, necessariamente e tão somente, as vitórias conquistadas, mas sim, o legado o qual vc quer deixar quando partir ou o que vc agregou para aquele momento histórico além de ter vitórias ou derrotas. Ele conclui que ele queria fazer algo que importasse. O meu legado seria, se eu tivesse partido, toda a minha coleção que por mais que possa parecer simplória e materialista, ela seria meu legado, minha construção e meu mundo. Foi nesse momento que senti que a goleada devia parar e começar a reagir, embora tenha noites que ainda perco.

Agora estou bem. Não terei sequelas no coração e no pulmão e terei cuidados diferentes pro resto da vida.

Obrigado por ler e deixo o link da cena do filme: https://youtu.be/IgKQ8z_xNhk.